Léo Daniel

Amar é servir. Servir é ser livre para Amar.

Textos

Imitação do impossível
COLUNA “O CONTADOR DE HISTÓRIAS”
LEONARDO DANIEL RIBEIRO BORGES


Imitação do impossível

Havia um lugar em que a lei era imitar, todos imitavam todos e ninguém era diferente, as pessoas apreendiam desde cedo que o certo era ser igual, pensar igual, se vestir igual, sentir e falar igual. As mentes eram moldadas conforme a tradição e os costumes e todos os dias se repetiam os gestos, as refeições, as prescrições quanto à saúde. Nasce então por volta do ano 12 de Leão uma criança que não fugiu do padrão, como todos, vai desde cedo à escola e lá recebe a programação.
Na escola se ensina que os mais velhos sabem o que as crianças devem aprender, e o único método é a repetição constante do que foi dito, até que os alunos sejam capazes de repetir palavra por palavra e sempre observando os professores para imitá-los o quanto mais pudessem. Imitar era prova de inteligência, havia os modelos mais perfeitos que imitavam de um jeito impressionante, só diziam, só sentiam o que pudesse ser imitado adiante, e todos viam nesses modelos um norte,. Inteligente, portanto era quem os imitava com convicta precisão. As profissões também tinham modelos de como ser perfeito e agradar os patrões (que também tinham seus modelos de perfeições), só desempenhava tal ou qual profissão quem tivesse mais aptidão para imitar o modelo daquela profissão.
Assim o papel da escola era testar os alunos até saber em que eles imitam melhor. A criança nascida no ano 12 de Leão mostrou desde cedo aptidão para ser professor, pois copiava muito rápido o que o professor ditava e nas provas e testes lembrava palavra por palavra do que foi dito, e, era isso que se exigia como formação.
A criança cresceu se formou e logo foi ser professor, todo cuidado era pouco, pois para toda profissão havia uma contra-profissão de imitadores treinados para o papel de inspetor, cada passo, cada gesto tinham que ser conforme o padrão aprendido na universidade, senão o professor teria que passar por uma reciclagem e receber uma reprogramação. No começo ia tudo bem, as crianças aprendiam a imitar com facilidade e paixão. Só que elas estavam interessadas demais e ai a história começa a mudar. Percebendo uma alteração na matriz escolar, os inspetores proíbem o professor de falar, já que aquele interesse todo observado nas crianças não era normal.
Mudo o professor começa sua aula. Na classe, disfarçados de criança, outros inspetores observam-no atentamente, o professor repara então que em seus alunos há uma incerteza uma desconfiança e mesmo assim pega no giz e vai pra lousa. Mudo, ele recorre aos gestos e ao corpo, foi esse o seu maior erro ou acerto. Algo nunca ocorrido ocorre pela primeira vez: o riso das crianças.
E rindo elas percebem algo estranho na boca, elas percebem com a língua que têm dentes, e assim sentem que têm língua, sentem que têm boca, sentem que algo aperta-lhes o rosto, eram as máscaras do engodo. Já sem máscaras sentem o ar tocando-lhes as faces, os inspetores sem saber o que acontecia travaram em seus programas e ficaram estáticos, como uma pedra.
O professor vendo aquilo tudo quase enlouqueceu, mas havia também uma falha em seu sistema e ele pode compreender que todos esses anos ele não tinha vivido realmente, vendo que as crianças estavam livres e voando céu adentro tentou imitá-las, mas não conseguiu, foi então que percebeu:
“Não se pode imitar o impossível, tem-se apenas que sentir o Íntimo”.
Olhando pra si pela primeira vez, percebe que tem os pés e mãos acorrentados aos passado e clama por socorro, olhando pro Céu vê o Sol, pela primeira vez e duplamente atingido, isto é, ofuscado e admirado, sente que as correntes desapareceram, não há mais quem imitar, e imitar a si é impossível, surge então de dentro da eternidade um grito que o chamou de NOVIDADE.



Leonardo Daniel Ribeiro Borges*
leodanielrb@yahoo.com.br
*Leonardo é poeta, professor e contador de histórias
Leonardo Daniel
Enviado por Leonardo Daniel em 28/10/2020


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